sexta-feira, 12 de dezembro de 2025

Douro, o relatório geral da vindima 2025

 (EN version here)

Paisagem de Outono, Celeirós do Douro.

 

Outono. O final da vindima ficou marcado pelas primeiras chuvas de Outono em toda a região, tempo chuvoso que se manteve durante o mês de Outubro com as temperaturas de acordo com os registos médios.

    Durante o Outono, as vinhas começam a entrar em repouso e preparam-se para um novo ciclo produtivo, à medida que o sol vai perdendo intensidade e as horas de luz do dia diminuem, as temperaturas vão baixando e a actividade das vinhas modifica-se, perdem gradualmente as folhas, diminuem o processo de fotossíntese, a actividade metabólica abranda, produzem menos energia e a respiração e o crescimento quase param, preparando-se para o período de dormência de Inverno, em que a videira descansa e se recompõe. Nesta fase, as videiras interrompem o crescimento e conservam energia, armazenam hidratos de carbono nas raízes, troncos a caules, preparando-se para o crescimento da próxima Primavera e adaptando-se às temperaturas mais frias do Inverno, reduzindo o movimento de água nos tecidos.

    No entanto, o ciclo do vinho continua, mesmo depois da vindima os trabalhos nas vinhas não param é também tempo de começar a planear o que vem a seguir, de preparar a terra e as vinhas para a próxima floração e para a qualidade da futura colheita, regressam os trabalhos de lavra e mobilização dos solos, lavrar e semear a terra para fazer sementeira.

    No mês de Novembro tem início a época dedicada à apanha da azeitona. 

    No final do mês começam os primeiros trabalhos de poda nas vinhas, que decorrem nos meses de Outono e Inverno, uma operação fundamental no ciclo da videira, para preparar e assegurar um bom desenvolvimento da planta na próxima Primavera, o rendimento da produção e a qualidade das uvas. No decurso destes trabalhos, é comum ver nos vinhedos das quintas, várias queimadas para, através do uso do fogo eliminar o material lenhoso resultante destes trabalhos e outro material vegetal.

    Em geral, foi um Outono com temperaturas amenas (superiores aos valores médios, entre 3 a 4ºC), excepcionalmente soalheiro e com alguma chuva no início e meados de Novembro. Choveu nos últimos dias de Novembro e início de Dezembro, e a partir daqui com as temperaturas a descer progressivamente e a anunciar o Inverno, e a surgirem geadas matinais nas vinhas.

Vinha em Celeirós do Douro.
 

Inverno.  Os meses frios de inverno são essenciais no período de repouso das vinhas em que a planta se concentra na sua preservação e contribuem também para controlar as pragas e as doenças.

    Nos primeiros dias de Inverno, depois de uma descida das temperaturas nos últimos dias do ano, registaram-se temperaturas um pouco acima dos valores médios, a depressão “Floriane” trouxe chuva a toda a região até ao dia 11 de Janeiro. Daqui em diante voltou o sol e o tempo seco e as temperaturas aumentaram bastante para esta época do ano (por exemplo, no dia 11 de Janeiro, a temperatura média no Pinhão estava 9ºC acima dos registos médios e o mesmo sucedeu noutras áreas da região, em geral entre 7 a 9ºC superiores aos valores médios), para logo a seguir descerem acentuadamente, com amanheceres gelados, dias frios e geada a cobrir os campos (na Vilariça, temperatura mínima, -5,3ºC no dia 14 de Janeiro), os dias frios típicos do mês de Janeiro. As temperaturas voltariam a subir com chuva no final do mês de Janeiro (depressão “Hermínia”).

    Em Janeiro continua o ritual da poda de Inverno, o primeiro grande trabalho nas vinhas do ano, que se pode prolongar até Março. Durante este período de pausa vegetativa, a planta está menos sensível ao stress e o risco de pragas e doenças é menor. As equipas de trabalhadores percorrem as paisagem de vinhas, num trabalho árduo, difícil e realizado com precisão e sabedoria, para reduzir a parte vegetativa da videira, o viticultor escolhe as varas que devem ficar para o ano seguinte e as varas que devem ser eliminadas (as partes danificadas ou improdutivas) para conseguir limitar o crescimento natural, um desenvolvimento mais equilibrado das vinhas e a qualidade da futura produção.

    Em Fevereiro, enquanto as vinhas descansam e prosseguem os últimos trabalhos de poda, em meados do mês, as amendoeiras começam a florir e as paisagne sdo Douro enchem-se de côr anunciando a Primavera. Nas vinhas, aos trabalhos de poda, segue-se a "empa", no final de Inverno e Primavera, os ramos da videira são amarrados ao tutor assegurando a distribuição da seiva por todas as varas, para que todos os gomos sejam igualmente alimentados e o crescimento da planta homogéneo, com o cuidado necessário para os ramos não se quebrem.

    No final do mês de Fevereiro e inicio de Março choveu em toda a região, as temperaturas mínimas desceram e nevou com alguma acumulação no alto da Serra do Marão.

Paisagem de Outono, Celeirós do Douro (2).

    Brevemente, os primeiros rebentos vão surgir e dar início a uma nova estação de renovação. No dia 6 de Março, na Quinta dos Malvedos surge a notícia de precoces sinais de abrolhamento nas videiras de Touriga Francesa que, como é habitual, são as primeiras a revelar-se e a iniciar o ciclo, apesar de serem também das últimas castas a amadurecer. Também na Quinta do Ataíde começou o abrolhamento e o ciclo de crescimento nas vinhas com o registo dos primeiros rebentos do ano. Antes da chegada da Primavera, as vinhas começam a despertar lentamente e a dar sinais de vida.

    A partir do início de Março, choveu em toda a região, mais forte a partir do dia 5 e que se prolongou até meados do mês (consequência da depressão "Jana"), houve instabilidade climatérica, com chuva, granizo, trovoada e neve nos pontos mais altos da serra do Marão. 

    Os meses de inverno foram chuvosos, a água armazenada no solo vai ser necessária para o desenvolvimento e crescimento da vinha e para criar uma reserva para os próximos meses mais quentes.

    Choveu muito no mês de Março, em maior quantidade do que o habitual com precipitação acima dos valores médios em toda a região, foi um mês que acumulou tempestades sucessivas. Curiosamente, choveu mais no Douro Superior do que no Cima Corgo (na Quinta do Vesúvio registaram-se 118mm, mais do dobro da média para o mês de Março nesta propriedade)

A Primavera e Verão. O início de Primavera teve tons de Inverno, com chuva forte em toda a região (20, 21 e 22 Março), os efeitos da depressão “Martinho”. A partir do dia 23 de Março, tempo seco e as temperaturas a subirem progressivamente, acima mesmo dos registos médios, mantendo-se todavia, uma grande amplitude térmica.

    Com a chegada da Primavera, o “choro da videira” no final do mês de Março, podemos testemunhar o despertar da videira com a libertação da seiva através dos cortes realizados na poda. A seiva começa a circular com o aumento da temperatura da terra e a planta começa progressivamente a recomeçar a sua actividade e a iniciar um novo ciclo de crescimento. O abrolhamento é a primeira fase desta renovação. É também um período de risco, em que a videira está mais sensível e exposta e que, por isso exige especial atenção do viticultor.

    No final de Março e início de Abril, a Primavera na vinha com temperaturas amenas, dias gradualmente mais longos e com a natureza em renovação, os primeiros gomos começam a romper e as frágeis folhas revelam-se e desenvolvem-se, com a primeira folhagem a paisagem começa a ganhar vida e os intensos tons verdes das primeiras folhas que antecedem a floração. Tem início uma nova fase do ciclo vegetativo da videira, as folhas vão incrementar a absorção da luz do sol e fornecer à videira a energia que é necessária para crescer e desenvolver-se.

    Tudo tem influência nesta fase, a altitude, a orientação, o tipo de solo, a temperatura de cada parcela, cada pequeno detalhe do ambiente faz a diferença no desenvolvimento da planta.

    No início de Abril, o abrolhamento mais generalizado das vinhas, enquanto continuam os trabalhos na vinha, com a “empa”. A chuva está de volta a toda a região.

   Nos trabalhos na vinha, o mês de Junho é altura de controlar o vigor de crescimento das videiras, o corte das pontas dos rebentos e o arejamento dos cachos e favorecimento da maturação.

    Houve uma vaga de calor no final da Primavera, entre 15 e 22 de Junho, foram emitidos avisos aos viticultores para escaldão na vinha e recomendação de medidas preventivas. As temperaturas máximas registadas foram muito altas, no Pinhão e Vale da Vilariça, 41ºC (no dia 17 de Junho) e superiores a 37ºC em vários pontos das sub-regiões. Tempo quente e seco. Houve uma persistência destes valores altos das temperaturas máximas, superiores aos valores médios para o mês de Junho. Registou-se uma segunda vaga de calor no final de Junho.

    No final de Junho, os bagos ainda verdes continuam em crescimento e começam a ganhar dimensão, corpo e textura até ao fecho do cacho. Com algum atraso relativamente ao ano anterior, a partir do início do mês de Julho, com as vinhas em pleno vigor, e com o sol e o calor, os cachos desenvolvem-se e a côr dos bagos começa a mudar e a ganhar côr, especialmente as castas tintas, com os primeiros sinais de maturação, é o começo da fase do”pintor”. As vinhas concentram os seus recursos, água e nutrientes, nos cachos, preparando-os para as próximas fases do ciclo.

    Em meados de Julho, assinalou-se o começo da época dos incêndios na região, com vários fogos florestais e um grande incêndio na área de Sabrosa que destruiu uma grande área florestal.

    No final de Julho, a natureza segue o seu ritmo, as vinhas estão em plena fase de maturação, algumas uvas ainda verdes e outras já pintadas, e o açúcar acumula-se lentamente nos bagos. A duração e intensidade deste processo dependem de vários factores, como a casta, as condições climáticas e o tipo de solo. Nesta fase importante do ciclo vegetativo, as equipas de viticultura e enologia acompanham no terreno a evolução das uvas, monitorizando e avaliando parâmetros como a acumulação de açúcares, a acidez total e o pH.

    No final de Julho e início de Agosto ocorreu uma nova onda de calor e no dia 5 de Agosto a região do Douro registou as temperaturas mais altas do país (temperaturas máximas registadas: 4Ago, no Pinhão, 42,1ºC, em Cambres 41,3ºC e no vale da Vilariça, 41,4ºC).

    Em resumo, até à vindima, um “ano vitícola está a ser atípico, quer em termos meteorológicos, quer do ciclo vegetativo da videira” (ADVID). A floração foi boa, mas depois as vinhas foram muito afectadas por doenças como o míldio e também o escaldão (as uvas foram expostas a temperaturas altas com as ondas de calor ocorridas em Junho e Julho) e, consequentemente a previsão é de uma quebra na colheita.
 
Vinha em Armamar.

 
A vindima.

    As estimativas de meados de Julho que referiam um atraso do ciclo em cerca de uma semana, não se concretizaram, em consequência das condições climáticas, altas temperaturas, com temperaturas máximas entre os 37 e os 40ºC e a ausência de precipitação, acabaram por ser determinantes e aceleraram a maturação das uvas.

    À procura do tempo certo para a colheita, com o acompanhamento constante da maturação.

Os apontamentos do início de vindima:

    A Real Companhia Velha, na Quinta das Carvalhas, iniciou a vindima no dia 13Ago na parcela da casta Bastardo e no dia seguinte, na Quinta do Cidrô, com a vindima do Sauvigon Blanc e Chardonnay e dia 16, na mesma quinta, a casta Pinot Noir. Naquela data, a Quinta do Vallado iniciou a vindima das uvas da casta Moscatel Galego branco, como habitualmente as primeiras a serem vindimadas naquela propriedade. Também a Quinta Seara D’Ordens com a vindima das uvas para vinhos base de espumante.

    A Quinta do Crasto, iniciou a colheita das castas brancas das cotas mais altas no dia 19Ago e no dia seguinte a Wine & Soul, também começou com as uvas brancas. Na Quinta do Vale Meão no Douro Superior, no dia 23Ago a vindima para os vinhos Brancos. Também no Douro Superior, Maritávora, no dia 20Ago.

    Em Favaios a vindima da casta Moscatel começou no dia 20Ago. Na Quinta do Côtto, no Baixo-Corgo, as primeiras uvas da casta Bastardo entram na adega, 24Ago. Na Kranemann Wine Estates, a mesma casta Bastardo é a primeira a ser vindimada no dia 25Ago.

    Na Quinta da Santa Bárbara, da Poças Júnior, em Ervedosa do Douro, na Quinta da Pedra Alta e na Quinta da Pacheca, a 22Ago. a colheita das castas brancas Moscatel Galego e Viosinho marcaram o início da vindima 2025.  Na Quevedo, a 23Ago, com a vindima da casta Viosinho das cotas entre os 250 e 500 metros na zona de São João da Pesqueira, uma das castas brancas mais precoces da região, que amadurece bastante rápido.

    Na Quinta do Vallado seguiu-se a vindima, no Douro Superior das castas tintas Baga e Alicante Bouschet, a 23Ago. Na Ramos Pinto, o primeiro lagar da vindima com Tinta Barroca, no dia 26Ago. No dia seguinte, o registo da Churchill’s, a colheita das uvas brancas da parcela 18 da Quinta da Gricha. No mesmo dia, a vindima das castas brancas na Quinta do Cume. Na Vieira de Sousa, início de vindima com as castas brancas, 28Ago. Na Quinta do Noval, o primeiro lagar da vindima a 29Ago. Na Vallegre a colheita começou no dia 31 de ASgosto, tanto na Vista Alegre como na Quinta de Valle Longo.

   Na Quinta da Côrte, no dia 2Set tem início da vindima com a casta Viosinho. Na Lavradores de Feitoria, no dia 9Set, tem início da vindima das castas tintas. E na Quinta dos Malvedos (Graham’s) a vindima começou no dia 10Set.

    Um momento importante da vindima ocorreu entre o final de Agosto e o início de Setembro, depois de várias semanas de tempo muito quente, as temperaturas baixaram progressivamente, e houve dias mais amenos e alguns períodos de chuva em toda a região (com maior incidência no Baixo-Corgo) que criaram condições mais favoráveis para as fases finais de maturação, com as amplitudes térmicas a aumentarem, temperaturas mínimas mais baixas e noites mais frescas.

   No final de Setembro, com algumas excepções, a vindima estava concluída para a maioria dos produtores da região, um capítulo encerrado depois de várias semanas de extremos e mais um ano muito desafiante.

O engaço, depois da prensagem.

Conclusões e comentários gerais.

    O primeiro facto relevante da vindima foi, desde logo, a quebra na produção, em relação à vindima anterior, uma diminuição entre os 30 e os 55%.

    Foi um ano irregular, atípico, de contrastes e extremos, com um Inverno seco e quente que começou por atrasar o ciclo vegetativo da videira, genericamente, o abrolhamento, a floração e o fecho do cacho, ocorreram com atraso em relação à média dos últimos anos. Depois tivemos uma Primavera, sobretudo os meses de Março e Abril com muita chuva e valores de precipitação superiores ao normal, o que provocou uma forte incidência, principalmente, de míldio na fase da pré-floração, floração e desenvolvimento da videira com um grande impacto na capacidade de produção.

   Depois o Verão foi longo, muito quente e seco, com ondas de calor e vários dias consecutivos com temperaturas de aprx. 40ºC em algumas zonas, fenómenos de escaldão e nos meses de Julho e Agosto algum stress hídrico nas vinhas, um segundo factor responsável pela quebra de produção ocorrida este ano. Em geral, 2025 foi um ano seco, mas apesar de tudo ainda longe dos anos mais secos de que há registo (2005, 2017 e 2022). As altas temperaturas levaram ao inicio antecipado da colheita das uvas brancas, e depois de um começo de vindima com temperaturas ainda altas e sem chuva, os primeiros dias de Setembro trouxeram temperaturas mais amenas e condições mais frescas e favoráveis que favoreceram a recuperação das videiras e maturações mais graduais e equilibradas.

   Mas, ao que tudo parece assinalar, apesar de ser um ano de baixa produção, inesperadamente foi um ano de grande qualidade, com algumas castas a apresentarem uma qualidade notável, com bagos mais pequenos mas com maior concentração e frescura.

Os vinhos. Vinhos DOC Douro são vigorosos e os vinhos do Porto, que prometem ser excelentes e mesmo memoráveis, com taninos firmes, cores intensas, excelente estrutura e intensidade aromática, equilíbrio, acidez baixa e pureza de fruta. Depois do entusiasmo com os vinhos do Porto produzidos em 2024 (em que se falou que seria o próximo ano Porto Vintage clássico), também em 2025 se registou uma grande exaltação com a extraordinária qualidade destes vinhos.

Texto e fotografias ©Hugo Sousa Machado

 Relatório anteriores e publicações relacionadas:

Douro, vindima 2025: os comentários exclusivos





 

Sem comentários :

Enviar um comentário